segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

A política e o desencanto

A política e o desencanto

Vejo muitas pessoas desencantadas com a política. Pior do que isso é ver outras acreditando que alguém poderá aparecer para salvar o nosso país das suas eternas amarguras, instantaneamente.  

Entre os desencantados, 70% dos jovens de 16 a 24 anos se mostraram, em uma pesquisa realizada no ano passado, não ter nenhum interesse em participar da vida política, 85% mantém distância do movimento estudantil, menos de 7% atuam em movimentos sociais, audiências públicas e conselhos municipais. A quem pertence o futuro deste país?

É mais do que justificável o crescimento do desencanto dos brasileiros pela política: nela não falta desonestidade, nela sobra incompetência, nela há exagero na arte de mentir, nela não há compromisso com o futuro da cidade e da nação, nela o gasto não se preocupa com o dia seguinte e nela se contrata pessoal além da necessidade. 

Não podemos nos desencantar com a política, assim abandonamos o Brasil à sua própria sorte. Há 2350 anos, Platão, filósofo grego, dizia: “o castigo dos bons que não fazem política é serem governados pelos maus”. Há 250 anos Kant acreditava que a razão humana pode definir o que é certo ou errado. Por isso, o melhor caminho é fazer o que é certo.

Juntando os dois filósofos, podemos até abandonar os políticos, mas jamais a política, caso contrário estaremos contribuindo para um país cada vez pior, eternizando a pobreza, a insegurança e a violência.

Se encantar com a política, se envolver com a política, fazer política, não significa se apresentar como candidato a qualquer cargo, significa estar ligado às ações políticas que impactam a vida de todos nós, opinando, criticando, sugerindo, e, sobretudo, acompanhando e cobrando os governantes e legisladores eleitos. É ser um povo que vive a política além dos períodos eleitorais e, desse povo, certamente sairá, progressivamente, políticos melhores.

Fazer política é aprender a conversar e negociar, saber que ninguém tem a verdade absoluta do que é melhor para todos. Saber que o importante é navegar entre os diversos interesses e encontrar o desejo da maioria, tendo como objetivo os benefícios comuns e os recuos necessários para o entendimento.

Devemos todos despertar para a importância da política em nossas vidas e batalhar por melhorias coletivas, não individuais, garimpando informações confiáveis para discutir com familiares, amigos e conhecidos. Podemos ser melhorados participando das associações de bairro, das organizações não governamentais, dos conselhos municipais, enfim, de qualquer entidade que trabalhe em busca do bem comum.

A política nos tira da zona de conforto? Com certeza! Mas também nos tira da posição incomoda que é criticar sem fazer nada para melhorar aquilo que a gente critica.

Generalização: erro imperdoável que pode ser devastador

 

Todos clamam por justiça, mas muitos podem cometer injustiças quando generalizam. A generalização, carregada de desprezo e ódio, se tornou prática frequente nos últimos tempos. Através dela as pessoas querem definir o caráter, a honestidade, o pensamento e a tendência política dos outros. Pior, quando julgam e condenam.

Nem todo jovem é vagabundo ou usuário de drogas.

Nem todo homem é safado ou violento contra as mulheres.

Nem toda mulher é interesseira ou gastona.

Nem todo advogado é desonesto.

Nem todo juiz vende sentença.

Nem todo promotor evita casos espinhosos.

Nem todo médico só quer ganhar dinheiro.

Nem todo patrão é explorador.

Nem todo empregado faz corpo mole.

Nem todo funcionário público é corrupto.

Nem todo político é ladrão.

Nem todo cozinheiro é sujo.

Nem todo pedreiro é enrolador.

Nem todo pobre quer roubar do rico.

Nem todo preto é criminoso.

Basta imaginar o que seria deste país se as nossas generalizações representassem a maioria da população. Nem é bom pensar.

As generalizações também abarcam temas como religião, artes, alimentação, esportes, legalização das drogas e do aborto, identidades de gênero e por aí afora.

Quando generalizamos, atribuímos às pessoas ou aos assuntos aquilo que imaginamos conhecer por conta de experiências passadas, ou nem sempre, fazendo abstração a partir de detalhes particulares não totalmente conhecidos. Generalizamos por indução de maneira inconsciente ou de maneira deliberada.

Enfim, quando generalizamos e ainda condenamos, a injustiça tem grande chance de estar presente. Aquela história de “conheço o cara pela cara” é apenas uma história.

O aniversário da minha cidade

 


No dia 24 de outubro celebramos a data de fundação de Itapira. Não é um dia qualquer. É o aniversário da minha cidade. No bolo, 201 velhinhas.

Itapira recebeu os meus antepassados, imigrantes italianos. Aqui meus pais nasceram, viveram, faleceram e onde estão sepultados. Neste lugar nasci, me criei, formei a minha família e construí grandes amizades. Nunca imaginei, nem por brincadeira, morando em outro lugar e o que faria se tivesse que partir, um dia, de mala e cuia.

Não contando os meus primeiros anos de vida, estou há 60 anos pisando neste chão - testemunha das minhas andanças – e participando direta ou indiretamente ou como espectador da maioria dos acontecimentos que escreveram a história recente da minha cidade.

Observo que Itapira vem mudando a cada ano. O “24 de outubro” de hoje não é tão festivo como o de antigamente. Noutros tempos, nessa data, eu tinha a sensação de que a cidade inteira se reunia na Praça Bernardino e na Rua José Bonifácio. De manhã, nos desfiles. À noite, nos shows. Era uma das datas mais esperadas do ano. O carnaval colocava o povo nos salões e nos desfiles de rua. A moçada marcava presença todos os sábados e domingos na praça central. As ruas com pedras foram trocadas pelo asfalto. Os velhos casarões, pouco a pouco, são substituídos por construções modernas. A Itapira da minha infância e adolescência quase não existe mais, mas está salva na minha memória que conta com obras primorosas de historiadores dedicados como Jácomo Mandato e Arlindo Bellini.

Em 1960, a população do município de Itapira girava em torno de 37 mil habitantes, mas na cidade não passávamos de 17 mil. Em 1970, subimos para 25 mil. Era uma maravilha. Pouco trânsito. Não tínhamos problemas com a falta de segurança, meia dúzia de soldados dava conta do recado. As madrugadas eram para quem quisesse curti-las. Hoje, com a população urbana está quadriplicada, o desenvolvimento nos beneficiou, mas trouxe problemas que não tínhamos a tiracolo.  

A minha Itapira de hoje sente falta de tanta gente que partiu, da praça cheia de gente, dos bares que não existem mais. A minha Itapira nunca foi só minha, pois nada pude fazer para mantê-la do jeito que eu queria. É que ela é de todos que aqui nasceram ou dos que a adotou como sua, principalmente, daqueles que aqui nasceram depois de mim, gente com novas ideias, com novas expectativas. É a trilha inexorável da evolução, goste eu ou não. Que assim seja e assim será para sempre!

O Baile dos Mascarados

 


É incrível, mas todas as gerações que passaram por este mundo fizeram o mesmo que a atual tenta fazer sem sucesso: manter o mundo imutável, do jeito que conheceu, sem mudanças significativas. Eu me refiro às mudanças sociais, que mexe com as configurações e com as estruturas da sociedade, alterando as referências culturais, os padrões de comportamento e os valores que regulam as relações individuais. Mudanças que vão dando aos mais velhos a dimensão de que realmente ficaram mais velhos. Essas mudanças nem sempre são acertadas, mas certamente são corrigidas ao longo do tempo, pois a motivação é a busca por mundo melhor. O mundo não deixa de mudar só para não contrariar os que não querem as mudanças, por mais ardorosa que seja a torcida contraria.

Até o início do século XX, entrava geração, saía geração, pouca coisa mudava. A partir de 1925 seis gerações transformaram o mundo: Veteranos, Baby Boomer, X, Y, Z e Alfa. Cada uma delas, com características próprias, impôs mudanças socialmente mais agressivas, renovando conceitos, apesar de muita resistência. O mundo é totalmente diferente do que há cem anos. Descobrimos que somos seres em transformação, que somos levados pela natureza, pela sociedade, pelas etapas da vida e pelo nosso crescimento pessoal. Somos mais escolarizados e mais conectados com o mundo. A cada avanço, as resistências caem. Os mais resistentes, mais cedo ou mais tarde, são vencidos. Quem não se rende acaba sofrendo por mais tempo. É a lei da evolução social que exige adaptação.

O termo “mascarado”, para ficarmos em um simples e corriqueiro exemplo, na minha vida aparece em quatro momentos distintos. O primeiro, nas brincadeiras de mocinho e bandido e nos bailes carnavalescos; só alegria. O segundo me faz lembrar dos amigos e conhecidos bons de bola ou bons de escola ou bons de qualquer outra coisa que, dependendo da postura arrogante, a gente chamava de “mascarado”; pura dor de cotovelo. O terceiro vem dos bandidos que usavam máscaras (muitos ainda usam) para a prática de crimes reais ou nos filmes; motivo de preocupação. Finalmente, o quarto, a máscara que veio para reduzir a propagação do vírus e nos proteger da Covid-19; medo de morrer.

Quando se fala em um mundo em transformação, devemos considerar: os fenômenos atmosféricos e climáticos; os grandes conflitos de poder, terra ou religião; a fome; as investidas ditatoriais, os arroubos da juventude e as pandemias que impactaram a humanidade: Peste Negra, século XIV, onde cerca de 150 milhões de pessoas morreram e a Gripe Espanhola, de 1918, que matou cerca de 50 milhões de pessoas. A máscara foi ajudante fundamental.

Hoje ninguém mais associa em primeiro plano a máscara como um adereço de brincadeira ou de carnaval ou de bandidagem. A máscara mais famosa é a que quase todo mundo está usando e que poderá ser um acessório presente nas nossas vidas daqui em diante.

O Baile dos Mascarados pode não terminar quando o Sol raiar. Depende de nós!

Amigo é coisa para se falar


Eu estava entretido com meu celular, esperava minha mulher que fazia compras, quando uma pessoa conhecida bateu na janela do meu carro. Compenetrado, levei um baita susto. Abri o vidro e ele me falou: “gosto de ler as coisas que você escreve, vou pedir para você escrever sobre os amigos e o quanto eles são importantes nas nossas vidas”. Pus-me a pensar!

Intempestivamente, mas o Dia do Amigo já passou. Pensei mais um pouco. Como não? É reconhecido que as datas comemorativas oficiais são importantes e provocam mais reflexões do que nos demais dias. Me questionei: é preciso ter um dia burocrático para refletirmos sobre o papel das mães, dos pais, dos amigos? Decididamente, não.

Eu construí amizades ao longo da vida. As principais somam quarenta, cinquenta anos. Nossos encontros aconteciam em restaurantes, churrascos, nas nossas casas, nas chácaras de recreio, nas viagens... O último deles aconteceu em uma pizzaria há 385 dias. Fomos separados pela pandemia. Nesse tempo, a gente se falava ao telefone ou por mensagens. Nos encontrávamos de vez em quando, guardando distância, cada um com sua máscara. Mas nada como estar juntos, discutindo assuntos sérios ou jogando conversa fora, trocando experiências na maior confiança, compartilhando alegrias e tristezas, comemorando as conquistas e não perdendo nenhuma oportunidade para zoar com a cara do outro.

Aos meus amigos, faço minhas as palavras de Vinicius de Moraes: “Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos. Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, embora não declare e não os procure. E às vezes, quando os procuro, noto que eles não têm noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital, porque eles fazem parte do mundo que eu, tremulamente construí e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida”.   

Nessa pandemia muita gente perdeu parentes, amigos e conhecidos. Mais gente, ainda, teve parentes, amigos e conhecidos que sofreram ou ainda sofrem com essa doença. Tudo isso é muito triste. Assim como é triste saber que quase todo mundo ficou, de um jeito ou de outro, tanto tempo sem poder encontrar com seus amigos.

Felizmente, e assim quero crer, estamos na reta final dessa pandemia. Com a vacinação avançando, falta pouco para voltar os encontros presenciais com amigos. Andei fazendo umas contas, acho que levaremos uns três ou quatro anos para colocar a conversa em dia, festejar os aniversários não festejados, os churrascos não “churrascados”, as saideiras não tomadas. Partiremos felizes para esse sacrifício!