segunda-feira, 2 de junho de 2025

Para muitos nonnos e nonnas: uma bela duma banana!


Entre 1870 e 1920, um êxodo silencioso marcou a história de dois países: 1,5 milhão de italianos cruzaram o Atlântico, desembarcando principalmente em São Paulo (60%), Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Espírito Santo e Paraná. Hoje, um terço dos brasileiros carrega DNA italiano. Em Itapira, estima-se, quase dois terços.

O governo italiano aprovou uma lei que restringe o acesso à cidadania “iure sanguinis” (direito de sangue), alegando "segurança nacional" e um suposto "fluxo descontrolado" de pedidos. A medida, sujeita a desafios judiciais, cortou o elo de milhões de descendentes com suas raízes.

É irônico: os mesmos italianos que fugiram da fome no século XIX agora têm seus netos e bisnetos barrados por burocracia. Seus sonhos de retorno – adiados pela pobreza, mas nunca abandonados – são hoje negados com um carimbo.

Até 1991, eu mal conhecia minha herança italiana. Foi a Festa dos 100 Anos da Família Marcati que desenterrou a saga de Bonifácio e Santa, seus filhos, suas lutas... Três anos mais tarde, com ajuda de um amigo italiano, reconectei os fios da memória.

Buscar a cidadania foi mais que um trâmite: foi reativar registros empoeirados, parados desde 1892 com a anotação "Emigrato in Brasile". Para nós, esse processo é a única forma de recolocar os avós, muitas vezes esquecidos, na linha do tempo.

Entende-se a necessidade de combater fraudes, mas alterar o princípio constitucional do ius sanguinis é cuspir na história. Quem já possui a cidadania italiana, nada muda. No entanto, para quem ainda não requereu, o caminho poderá ser muito espinhoso, com grande chance de ser negado. Os italianos que aqui chegaram não vieram por turismo – vieram para sobreviver. O Brasil os acolheu e prosperou com seu suor, mas seu coração sempre bateu em dois lugares.

Enfim, o governo italiano lhes oferece uma "bela duma banana" (como diria um nonno indignado). É um corte não só jurídico, mas afetivo.