quarta-feira, 30 de junho de 2021

Deus estaria sendo cancelado pelo marketing negativo?

No início do século passado, 99% da população brasileira se declarava católica. Como nem se falava em ateísmo naquela época, podemos dizer, juntando as demais religiões, todo mundo acreditava em Deus. No início deste ano foi publicada uma pesquisa onde 50% dos entrevistados se declararam católicos; 31%, evangélicos e 8% citaram outras religiões; em suma, a maioria, 89%, coloca Deus sobre todas as coisas. Mas o que mais me chamou a atenção não foi a forte migração de católicos para as igrejas evangélicas, mas os “11%” que faltaram para fechar a conta. Considerando a margem de erro, é possível afirmar que entre 23 a 30 milhões de pessoas são assumidamente descrentes ou não consideram intermediários para assuntos divinos. Em tese, é gente sem fé. Em linguagem atual, Deus pode estar sendo vítima da cultura do cancelamento, nesse caso, no coração das pessoas.

Não é novidade dizer que estamos vivendo um processo de desconstrução das práticas e dos costumes antigos. Até aí, tudo bem, faz parte da evolução social e não há nada que possa ser feito para interrompe-la. É um processo contínuo. Vem de antanho.

A internet virou um campo de discussão de ideias e de manifestações contra comportamentos considerados errados cometidos por alguma pessoa ou grupo. A cultura do cancelamento é um recurso rápido para tentar “impedir” que os “cancelados” continuem disseminando “as coisas erradas”. Quase um julgamento olho por olho, dente por dente. Para os que cancelam, só os cancelados cometem erros. Não há tempo de prescrição. O erro do cancelado nem precisa ser recente, como ele não foi condenado no passado, o presente deve fazer justiça. Nessa esteira, injustiças imperam.

Retomando o tema: que erro Deus poderia ter cometido para ser cancelado por uma parcela significativa da população brasileira? Pensei e conclui que se Deus cometeu algum erro, este seria o livre-arbítrio que Ele concedeu à humanidade. Quem nega Deus não sai por aí tentando converter os outros ao ateísmo, esses só se manifestam quando provocados. Para o ateu, falar mal de Deus, não faz sentido. Mas tem aqueles que professam fé inconteste em Deus, mas podem estar servindo como contraexemplo.

Santo Agostinho nos ensina que o livre-arbítrio é um bem concedido ao homem por Deus, mesmo que o homem o utilize de forma errônea e provoque o mal. E adverte: “Deus criou o livre-arbítrio, porém este não é um mal, mas um bem que procede de Deus. O homem é quem faz dele (do livre arbítrio) um meio para se chegar ao mal. Se sua escolha for o mal, nunca poderá ter liberdade. ”

São bons exemplos aqueles dirigentes religiosos que usam da fé dos fieis para obter vantagens financeiras ou que cometem malfeitos diversos ou que usam do poder de oratória para orientar seus cativos para caminhos estranhos e duvidosos? Esses não estariam distanciando Deus das pessoas?

São bons exemplos os empresários, os profissionais, os políticos ou qualquer pessoa deste mundo que clamam por Deus (ou Jesus Cristo) de forma sistemática e constante, denotando interesse em obter retornos de popularidade ou financeiros? Esses não comprometem a fé em Deus?

São bons exemplos o uso de imagens religiosas e juramentos bíblicos nas salas dos poderes legislativo, executivo e judiciário, onde decisões nem sempre confessáveis são tomadas? Seria isso um marketing positivo de Deus?  

As religiões não devem desaparecer da face da Terra ao longo dos tempos. Mas há duas previsões esperadas ainda neste século: o aumento considerável do ateísmo e dos sem religião; e o aumento das religiões fundamentalistas, aquelas que estabelecem comportamentos mais restritivos aos fiéis; tudo isso provocado pelo marketing negativo de Deus. O futuro a conferir...